Em O Brutalista conhecemos László, um homem que foge de seu país na Segunda Guerra e tenta sobreviver nos Estados Unidos através do seu trabalho de arquiteto.
Esse é o grande favorito ao prêmio de melhor filme no oscar 2025, e provavelmente ao que tudo indica, deve ser mesmo o vencedor, o que é engraçado de se pensar, porque de certa maneira ele é extremamente parecido com Oppenheimer, vencedor do ano passado, veja só...
Um homem cheio de traumas e obcecado pelo seu trabalho viaja para os Estados Unidos durante a segunda guerra em busca de oportunidades, sua genialidade é descoberta e a oportunidade vem, mas logo o protagonista nota que essa coroa vem cheia de espinhos, o que acaba justamente aprofundando esses traumas do passado.
Além do mais, ambos os filmes possuem atores que são muito conhecidos por fazerem essa espécie de galãs feios, esquisitos, perturbados, mas estranhamente atraentes.
Mas vamos por partes?
A primeira parte do filme, até o intermission, é perfeita, é um paralelo muito bem estabelecido com a vida pessoal do László e seus projetos como arquiteto. São prédios que parecem funcionar sem uma parte, mas que continuam a funcionar porque as outras partes ainda existem.
László carrega no olhar o peso de quem sobreviveu a uma das maiores tragédias da humanidade, e o filme se sobressai de outras abordagens parecidas sobre o mesmo tema por não tornar o personagem somente em alguém que sobreviveu e deseja reencontrar sua família...
Há mais, há desejo, se não de se relacionar com alguém, pelo menos o sexual, e há também o desejo de ser reconhecido pelo trabalho que faz.
Eu gosto como o filme consegue ser compreensivo com o protagonista sem deixar de mostrar que ele não é perfeito, ele é obcecado e infiel.
E essa infidelidade parece surgir mais de uma solidão do que necessariamente da vontade de se relacionar com outras mulheres.
Essa solidão, esse vazio, é justamente o reflexo daquilo que sempre parece faltar em suas obras.
László ainda existe, mesmo que a guerra tenha levado uma parte de quem ele era.
Mas o que falta?
Através dessa pergunta o filme "brinca" com a ideia do sonho americano, onde tudo pode ser possível na América, e de fato é, mas depende com quem você se relaciona e depende também se você está disposto ou não a vender um pedaço da sua alma para isso.
László vende, porque não parece ter outra escolha diante do fascínio que tem diante do poder de Harrison (Guy Pearce), esse fascínio inicialmente é mútuo, com Harrison apaixonado pelo trabalho László e László apaixonado pela ideia de poder alcançar a vida que um dia teve através do poder financeiro de Harrison.
Dessa relação criam-se monumentos de traumas que não parecem ter mais fim, Harrison, com o tempo se vê ameaçado pelo infinito poder criativo de László e László se vê ameaçado pela ideia de não poder concluir o seu projeto mais grandioso.
Acho muito interessante como o filme trabalha a ideia do poder da imagem, ainda que fale especificamente sobre Arquitetura, também não deixa de ser uma ode a todo tipo de arte, demonstrando também que a capacidade da arte vai muito além do que algo supérfluo, como é visto por muita gente na sociedade.
É através de uma foto que Harrison enxerga a beleza do trabalho de László, e é através das fotos registradas dos projetos antigos de László, que ele acaba sendo contratado para ser responsável pelo projeto de Harrison.
A fotografia do filme também consegue realçar muito bem essas imagens, através de planos mais abertos que demonstram a grandiosidade desses locais que querendo ou não, são símbolos, assim como a Estátua da Liberdade de ponta cabeça vista no primeiro take do filme dentro dos Estados Unidos.
Ponto.
Depois do intermission essa sutileza se perde em diversos momentos numa tentativa de demonstrar com mais clareza aquilo que já havia sido mostrado de outra forma num primeiro momento.
Não dá para dizer que essa segunda parte do filme é desnecessária, afinal, é o momento em que toda a construção (interna, externa e literal) precisa se tornar em algo concreto (rs) e aí talvez não seja um problema de roteiro, mas sim da direção em não saber lidar tão bem com coisas que já estão sobrepostas, com coisas que já estão construídas até certo ponto, como o prédio de László.
Assim como László, o diretor Brady Corbet parece lidar bem com a busca, mas acaba se vendo perdido quando alcança aquilo que desejava.
Ironicamente, a obsessão de László também impede que ele seja capaz de concluir o seu projeto, e quando ele finalmente tem tudo o que deseja, resta somente a obsessão da procura por algo que já não existe.
Essa segunda parte grita por um oscar, mostra o que anteriormente havia ficado nas entrelinhas antes, potencializa traumas através de discussões e tenta alcançar uma grandiosidade que parece não pertencer a ele.
Ou será que pertence e não estamos prontos para entender, assim como Harrison não entendeu ao ver sua biblioteca reestruturada pela primeira vez?
Talvez por isso a construção nunca concluída, mostrada nas últimas cenas do filme, represente tão bem o que é O Brutalista...
É essa obra que mesmo passando uma sensação de incompletude, é capaz de encantar pelas partes que nos fazem pensar em quão incrível poderia ter sido.
A vida é essa junção de partes que formam um todo, incompleto.
Ahhhhhh que texto em . Bom demais.